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"Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros. Sem livros, sem leitura, os nossos filhos serão incapazes de escrever - inclusive a sua própria história." Bill Gates

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quarta-feira, 13 de outubro de 2010

AS ELEIÇÕES E OS APROVEITADORES DA BOA FÉ E DA CREDULIDADE EVANGÉLICA


Rev. Sandro Amadeu Cerveira (02/10/10)

Talvez eu tenha falhado como pastor nestas eleições. Digo isso porque estou com a impressão de ter feito pouco para desconstruir ou no pelo menos problematizar a onda de boataria e os posicionamentos “ungidos” de alguns caciques evangélicos. [1]
Talvez o mais grotesco tenham sido os emails e “vídeos” afirmando que votar em Dilma e no PT seria o mesmo que apoiar uma conspiração que mataria Dilma (por meios sobrenaturais) assim que fosse eleita e logo a seguir implantaria no Brasil uma ditadura comunista-luciferiana pelas mãos do filho de Michel Temer. Em outras o próprio Temer seria o satanista mor. Confesso que não respondi publicamente esse tipo de mensagem por acreditar que tamanha absurdo seria rejeitada pelo bom senso de meus irmãos evangélicos. Para além da “viagem” do conteúdo a absoluta falta de fontes e provas para estas “notícias” deveria ter levado (acreditei) as pessoas de boa fé a pelo menos desconfiar destas graves acusações infundadas. [2]
A candidata Marina Silva, uma evangélica da Assembléia de Deus, até onde se sabe sem qualquer mancha em sua biografia, também não saiu ilesa. Várias denominações evangélicas antes fervorosas defensoras de um “candidato evangélico” a presidência da república simplesmente ignoraram esta assembleiana de longa data.
Como se não bastasse, Marina foi também acusada pelo pastor Silas Malafaia de ser “dissimulada”, “pior do que o ímpio” e defender, (segundo ele), um plebiscito sobre o aborto. Surpreende como um líder da inteligência de Malafaia declare seu apoio a Marina em um dia, mude de voto três dias depois e à apenas 6 dias das eleições desconheça as proposições de sua irmã na fé.
De fato Marina Silva afirmou (desde cedo na campanha, diga-se de passagem) que “casos de alta complexidade cultural, moral, social e espiritual como esses, (aborto e maconha) deveriam ser debatidos pela sociedade na forma de plebiscito” [3], mas de fato não disse que uma vez eleita ela convocaria esse plebiscito.

O mais surpreendentemente, porém foi o absoluto silêncio quanto ao candidato José Serra. O candidato tucano foi curiosamente poupado. Somente a campanha adversária lembrou que foi ele, Serra a trazer o aborto para dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) [4]. Enquanto ministro da saúde o candidato do PSDB assinou em 1998 a norma técnica do SUS ordenando regras para fazer abortos previstos em lei, até o 5º mês de gravidez [5]. Fiquei intrigado que nenhum colega pastor absolutamente contra o aborto tenha se dignado a me avisar desta “barbaridade”.
Também foi de estranhar que nenhum pastor preocupado com a legalização das drogas tenha disparado uma enxurrada de-mails alertando os evangélicos de que o presidente de honra do PSDB, e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso defenda a descriminalização da posse de maconha para o consumo pessoal [6].
Por fim nem Malafaia, nem os boateiros de plantão tiveram interesse em dar visibilidade a noticia veiculada pelo jornal a Folha de São Paulo (Edição eletrônica de 21/06/10) nos alertando para o fato de que “O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, afirmou nesta segunda-feira ser a favor da união civil e da adoção de crianças por casais homossexuais.” [7]
Depois de tudo isso é razoável desconfiar que o problema não esteja realmente na posição que os candidatos tenham sobre o aborto, união civil e adoção de crianças por homossexuais ou ainda a descriminalização da maconha. Se o problema fosse realmente o comprometimento dos candidatos e seus partidos com as questões acima os líderes evangélicos que abominam estas propostas não teriam alternativa.
A única postura coerente seria então pregar o voto nulo, branco ou ainda a ausência justificada. Se tivessem realmente a coragem que aparentam em suas bravatas televisivas deveriam convocar um boicote às eleições. Um gigantesco protesto a-partidário denunciando o fato de que nenhum dos candidatos com chances de ser eleitos tenha realmente se comprometido de forma clara e inequívoca com os valores evangélicos. Fazer uma denuncia seletiva de quem esta comprometido com a “iniqüidade” é, no mínimo, desonesto.
Falar mal de candidato A e beneficiar B por tabela (sendo que B está igualmente comprometido com os mesmo “problemas”) é muito fácil. Difícil é se arriscar num ato conseqüente de desobediência civil como fez Luther King quando entendeu que as leis de seu país eram iníquas.
Termino dizendo que não deixarei de votar nestas eleições.
Não o farei por ter alguma esperança de que o Estado brasileiro transforme nossos costumes e percepções morais em lei criminalizando o que consideramos pecado. Aliás tenho verdadeiro pavor de abrir esse precedente.
Não o farei porque acredite que a pessoa em quem votarei seja católica, cristã ou evangélica e isso vá “abençoar” o Brasil. Sei, como lembrou o apóstolo Paulo, que se agisse assim teria de sair do mundo.
Votarei consciente de que os temas aqui mencionados (união civil de pessoas do mesmo sexo, descriminalização do aborto, descriminalização de algumas drogas entre outras polêmicas) não serão resolvidos pelo presidente ou presidenta da república. Como qualquer pessoa informada sobre o tema, sei que assuntos assim devem ser discutidos pela sociedade civil, pelo legislativo e eventualmente pelo judiciário (como foi o caso da lei de biossegurança) [8] com serenidade e racionalidade.
Votarei na pessoa que acredito representa o melhor projeto político para o Brasil levando em conta outras questões (aparentemente esquecidas pelos lideres evangélicos presentes na mídia) tais como distribuição de renda, justiça social, direitos humanos, tratamento digno para os profissionais da educação, entre outros temas. (Ver Mateus 25: 31-46) Estas questões até podem não interessar aos líderes evangélicos e cristãos em geral que já ascenderam à classe média alta, mas certamente tem toda a relevância para nossos irmãos mais pobres.
______________________
NOTAS
[1] As afirmações que faço ao longo deste texto estão baseadas em informações públicas e amplamente divulgadas pelos meios de comunicação. Apresento os links dos jornais e documentos utilizados para verificação.
Como nossa página não oferece o recurso de postar comentário diretamente nesta parte convido aos que desejarem faze-lo a enviar um email para segundaigreja@segundaigreja.org.br em nome do Rev. Sandro que publicaremos com prazer.

* O Reverendo Sandro Amadeu Cerveira além de pastor titular da Segunda Igreja é professor universitário, com formação em Teologia pastoral, graduação em História, mestrado em Ciência Política (UFMG) no momento encontra-se na fase final do seu doutorado em Ciência Política também pela UFMG.






4 comentários:

  1. Salve, Rodrigo.

    Somos, ou ao menos pretendemos ser, formadores de opinião e como tal temos que ter responsabilidade sobre o que passamos aos outros.
    Checar as fontes de informações é o básico.
    Ao mesmo tempo em que concordo com o pastor em alguns pontos, noutros discordo.
    Não é de hoje que os órgãos de comunicação assumem posições políticas que atendam aos seus interesses comerciais. Dessa forma, temos veículos que trazem visões antagônicas de um mesmo fato, a exemplo das revistas Veja e Época, da televisões Globo, Band e SBT....
    Então para que o leitor seja realmente bem informado, dele ler pelo menos as duas versões e ter o senso crítico e ponderação sara saber até onde vai a verdade e onde desejam inferir-nos idéias fabricadas.

    A opinião pessoal, no caso a Dilma, expressa em seu blog não tornam os fatos verdadeiros. É apenas o ponto de vista cheio de parcialidade e a conveniência daquele momento.
    A definição dos procedimentos para o aborto legal, cumpria uma determinação do MPU quanto ao cumprimento da lei pelos hospitais públicos. José Serra assinou porque ele era o ministro da saúde e cabia ao ministro assinar. Dilma Rousseff teria feito a mesma coisa, caso fosse ela a titular da pasta da saúde, naquele momento.

    Eu não acho certa união entre pessoas do mesmo sexo, contudo o fato que se quer regulamentar não diz respeito ao que é certo e sim sobre o que é justo ou injusto. Se duas pessoas vivem juntas e constroem um patrimônio em conjunto, eles devem ter a segurança jurídica de ter o que é seu por direito, e que isso não vá parar nas mãos de outros, que em nada contribuíram para essa construção.
    A união gay não é uma realidade recente na humanidade e o fato de não haver legislação para essa união nunca foi fato impeditivo para que elas existissem.

    Todas as facções políticas criam factóides para diminuir a estatura do seu oponente, da mesma maneira como tentam criar uma imagem positiva, carregando criancinhas, tomando cafezinhos nos mercados públicos, andando pelas ruas e abraçando eleitores que nunca viu, loucos para que o eleitor se identifique e pense: “Ele(a) pensa como eu”, “Eu também sou assim”....

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  2. Grande André,

    Seus comentários e observações são sempre muito bem vindos, como tudo na vida existem parcialidades, o artigo do reverendo não seria diferente. No momento em que expressamos nossas opniões somos parciais. Também não concordo com tudo com que ele escreveu, mas este é um espaço para colocarmos opniões não apenas que concordamos plenamente, mas opniões que nos levem a pensar e desenvolvermos nosso senso crítico sob os aspectos da fé e dos seus impactos na humanidade.

    Se você também vem acompanhando alguns posicionamentos no Twitter, viu que comentei que todas as vezes que a igreja se união ao estado para governar, ambos deixaram de fazer sua função. Não devemos ser apolíticos, por termos fé num governo que não está fundamentado neste mundo, mas não podemos esperar a solução de todas as mazelas deste mundo.

    A discussão está aberta!!!

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  3. A oportunidade de ler, refletir e reagir, seja se contrapondo ou incorporando novos conceitos, é pra mim o grande barato dos blogs que acompanho.
    E este seu e top de linha.

    Quanto ao Twetter, não sou um frequentador assiduo. não gosoto da limitação de espaço para a exposição de idéias.
    Mas, a partir de agora, darei mais atenção.

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  4. Top de Linha?!?! Obrigado pela classificação! Quanto ao Twitter, é uma arte condensar informação em 140 caracteres e ainda despertar interesse.

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