Publicado por Sostenes Lima
Quando cito um trecho do mito de Prometeu, não preciso dizer a ninguém que não estou tomando a narrativa como história, mas como mito. Mas se eu resolver citar um trecho da história da Torre de Babel, devo começar dizendo que se trata de um mito, para não ser tachado de estúpido. Por que preciso dizer que Torre de Babel é um mito? Isso deveria ser um pressuposto básico.
Quando digo que Prometeu é o inventor da tecnologia ninguém acha que estou tratando Prometeu como um sujeito histórico. Mas se falo de Jó, a maioria das pessoas acha que estou me referindo a um sujeito histórico. Caso eu queira ser compreendido de outra forma, devo dizer expressamente que Jó é personagem de uma narrativa/debate de sabedoria trágico-épico, não um sujeito histórico como Moisés.
Gostaria que certos pressupostos básicos aplicados às narrativas míticas e fantásticas (não bíblicas) também fossem aplicados a certas narrativas bíblicas. Por exemplo, quando conto a história de Branca de Neve, ninguém me pergunta se eu acredito ou não em Branca de Neve. As pessoas simplesmente ouvem e fruem a história, tirando dela lições éticas e, até, valores transcendentes. Por que, quando conto a história da Serpente no Éden, as pessoas não aplicam o mesmo pressuposto? Por que preciso responder se acredito ou não em serpentes falantes?
A bíblia é para mim, sobretudo, um livro de poesia. Rubem Alves me ensinou que Deus é um poeta, não um repórter ou historiador. Em Teologia do cotidiano, ele diz: “Eu leio os textos sagrados como quem lê poesia e não como quem lê jornal. Prefiro pensar que Deus é poeta a imaginá-lo como dono de um jornal. Existirá ofensa maior para um poeta que perguntar se o seu poema é reportagem?”.
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