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por Alex aantunes, no Yahoo Notícias
Foi Luciano Huck, após ser assaltado em outubro de 2007, que escreveu a respeito de seu próprio assassinato essa fantasia bizarra: "Uma jovem viúva. Uma família destroçada. Uma multidão bastante triste. Um governador envergonhado. Um presidente em silêncio. Por quê? Por causa de um relógio".
Como se vê, Huck atribuiu a si mesmo uma importância social extraordinária – provavelmente já contando com o sensacionalismo turbinado da mídia nos casos que envolvem, err, celebridades. Mas também nos obriga a lembrar um detalhe. Não era “um relógio” qualquer, era um rolex. De ouro. E um rolex de ouro pode custar até centenas de milhares de reais. Com sua peculiar sensibilidade social, Huck não entendeu que um maluco com muitos milhares de reais pendurados no pulso pode, sim, ser assaltado, e talvez morto. O rolex de Huck, naquele ano, consta, custava R$ 39 mil. No Brasil mata-se por muito (mas muito) menos.
Entre outras respostas contundentes, vieram a do escritor Ferréz (que imaginou o drama do outro lado, o do ladrão) e a de Zeca Baleiro. É uma ponderação de Zeca que me interessa agora: "Eu também reclamaria caso roubassem algo comprado com o suor do rosto. Reclamaria na mesa de bar, em família, na roda de amigos. Nunca num jornal. Esse argumento, apesar de prosaico, é pra mim o xis da questão. Por que um cidadão vem a público mostrar sua revolta com a situação do país, alardeando senso de justiça social, só quando é roubado? Lançando mão de privilégio dado a personalidades, utiliza um espaço de debates políticos e adultos para reclamações pessoais (sim, não fez mais que isso), escorado em argumentos quase infantis, como 'sou cidadão, pago meus impostos'".
Ontem, Luciano Huck fez pior. A história começou no domingo, num jogo na Espanha. Como todo mundo já deve saber, o jogador brasileiro do Barcelona, Daniel Alves, foi alvo de uma banana arremessada. Antes de cobrar um escanteio, em uma inspiração momentânea (pelo menos aparentemente, como veremos), Alves comeu a banana, como se nada estivesse acontecendo. O vídeo correu mundo – mas a coisa não parou nisso.
Foi Luciano Huck, após ser assaltado em outubro de 2007, que escreveu a respeito de seu próprio assassinato essa fantasia bizarra: "Uma jovem viúva. Uma família destroçada. Uma multidão bastante triste. Um governador envergonhado. Um presidente em silêncio. Por quê? Por causa de um relógio".
Como se vê, Huck atribuiu a si mesmo uma importância social extraordinária – provavelmente já contando com o sensacionalismo turbinado da mídia nos casos que envolvem, err, celebridades. Mas também nos obriga a lembrar um detalhe. Não era “um relógio” qualquer, era um rolex. De ouro. E um rolex de ouro pode custar até centenas de milhares de reais. Com sua peculiar sensibilidade social, Huck não entendeu que um maluco com muitos milhares de reais pendurados no pulso pode, sim, ser assaltado, e talvez morto. O rolex de Huck, naquele ano, consta, custava R$ 39 mil. No Brasil mata-se por muito (mas muito) menos.
Entre outras respostas contundentes, vieram a do escritor Ferréz (que imaginou o drama do outro lado, o do ladrão) e a de Zeca Baleiro. É uma ponderação de Zeca que me interessa agora: "Eu também reclamaria caso roubassem algo comprado com o suor do rosto. Reclamaria na mesa de bar, em família, na roda de amigos. Nunca num jornal. Esse argumento, apesar de prosaico, é pra mim o xis da questão. Por que um cidadão vem a público mostrar sua revolta com a situação do país, alardeando senso de justiça social, só quando é roubado? Lançando mão de privilégio dado a personalidades, utiliza um espaço de debates políticos e adultos para reclamações pessoais (sim, não fez mais que isso), escorado em argumentos quase infantis, como 'sou cidadão, pago meus impostos'".
Ontem, Luciano Huck fez pior. A história começou no domingo, num jogo na Espanha. Como todo mundo já deve saber, o jogador brasileiro do Barcelona, Daniel Alves, foi alvo de uma banana arremessada. Antes de cobrar um escanteio, em uma inspiração momentânea (pelo menos aparentemente, como veremos), Alves comeu a banana, como se nada estivesse acontecendo. O vídeo correu mundo – mas a coisa não parou nisso.
Continuou, e aumentou, com uma manifestação um tanto esquisita de Neymar, que postou foto também comendo banana, ao lado de seu filho. Esquisita porque Neymar, seu colega de time, já tinha nos explicado no final de 2013 que “nunca foi vítima de racismo – até porque não é preto, né”, reforçando a declaração em mais de uma entrevista.
Talvez Neymar tenha superado a amnésia traumática e lembrado que já foi sim alvo de agressões racistas. Por exemplo na Bolívia, em 2012, quando, ainda no Santos, foi alvo de bananas. Então a tag que lançou junto com a foto, #somostodosmacacos, seria um pouco menos impessoal. Além dele, ao longo da segunda-feira, gente como Alexandre Pires, Michel Teló, Ivete Sangalo, Claudia Leitte, Fátima Bernardes, Ana Maria Braga, Dinho Ouro Preto e Reinaldo Azevedo (!), além do Inri Cristo, postaram suas respectivas (ops) bananas.
Pareceria um caso, sempre meio bobo, de viral-celebridade, se dois desdobramentos não viessem a público: a) a tag #somostodosmacacos foi criada por uma agência de publicidade, a Loducca. Como no caso da cueca, Neymar gosta de fazer publicidade disfarçada. Questionado, um executivo da agência respondeu que “tentar desmerecer o movimento pelo fato de ter uma agência por trás é tão preoconceituoso quanto o torcedor que joga a banana. Por que não pode haver ajuda profissional? Não é uma campanha para vender nada”; b) a loja de Luciano Huck, o primeiro depois de Neymar a postar foto sua (com a esposa Angélica), já tinha pronta para vender uma camiseta com a tag e banana, a R$ 69 reais. Ou seja, se a Loducca só queria “vender boas intenções”, para Luciano Huck isso não era um impedimento. E nem roubar a banana do Andy Warhol na capa do disco Velvet Underground.
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Em 2011, Luciano e a empresa de descontos à qual tinha se associado, a Peixe Urbano, (supostamente) faziam doações paras as vítimas das enchentes naquele ano – mas você tinha que se cadastrar no site, antes de “comprar os cupons de doação”. No mínimo, mesmo que as doações chegassem integralmente (o que é improvável), era um modo de Luciano colocar sua base de fãs e seguidores no cadastro de vendas, usando a tragédia como desculpa.
A casa de Huck na ilha das Palmeiras, em Angra dos Reis, é construída numa área de proteção ambiental. Para se livrar da acusação, Huck contratou o escritório de advocacia da então primeira dama do Rio – e o governador Sérgio Cabral, em 2010, editou um decreto (que logo ficou conhecido como “Lei Luciano Huck”) para resolver o probleminha do apresentador. Não satisfeito, no ano seguinte Huck foi acusado de impedir o acesso à sua “praia particular” com bóias ilegais.
Uma jovem viúva. Uma coxinha destroçada. É difícil imaginar o poderoso “macaco” Huck sendo xingado ou perseguido como um negro, ameaçado de um pipoco grátis (exceto talvez se insistir em andar por aí com seu rolex). Como aconteceu com Oswaldo Zaratini, que na semana passada teve o azar de, sendo negro, ser sequestrado – quando desceu do carro foi morto pela polícia (o sequestrador, branco, sobreviveu).
Alguns comentaristas acharam a tag #somostodosmacacos racista e negativa. Eu tenderia a achá-la boba, além de oportunista – se ficasse no universo dos jogadores e de seus fãs-celebridade. Parece coisa de, err, publicitário. Mas o “roubo” da doença social do racismo no futebol por um playboy amoral e oportunista transforma a coisa toda não só em um escândalo, como em um foco de vergonha alheia lancinante.
Talvez #somostodosbananas fosse mais preciso. Ou #somostodosrecheadosdefrangodesfiado. Eu simpatizo com a idéia de descender do macaco, até porque um homem que cruzasse com uma costela provavelmente geraria um tipo de exoesqueleto, como o Alien.
Talvez descendamos do cruzamento do macaco com o porco, como defendeu há uns meses o geneticista norteamericano Eugene McCarthy. O que daria um bicho menos peludo, inconsequente e agitado, e mais estável e rosado, como um executivo. Ou um apresentador. Faz sentido. #somostodoscinicosoportunistas (não, não somos).
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