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quarta-feira, 17 de abril de 2013

Homens bons, religiosos maus

imagem: google

Ricardo Gondim, no seu site
No judaísmo contemporâneo de Jesus, o fariseu representava uma facção austera, conservadora, dogmática. Embora tenham sido execrados como ícones da demagogia religiosa, é preciso todo cuidado para não discriminá-los. Não devemos generalizar, nem quando se trata de uma seita rotulada a priori como falsa. Sim, é verdade, Jesus denunciou que eles estavam fermentados pela hipocrisia. Contudo, torna-se necessário também reconhecer que mesmo em uma instituição religiosa adoecida, joio e trigo convivem juntos.
Hipocrisia, no contexto dos fariseus, significa falsidade, dissimulação, mera representação, incoerência. Um hipócrita religioso, então, seria alguém que prega, mas não vive – um santarrão público, pecador de bastidores.
Existe, todavia, outra possibilidade de entender a hipocrisia, percebendo a incoerência dos fariseus em sentido inverso. Eles se mostravam bons quando se distanciavam dos espaços religiosos, mas se comportavam como gente horrorosa, quando investidos nas funções sacerdotais. O farisaísmo tipificou um clero perverso nos conclaves e dóceis na vida privada.
Jesus lidou com os fariseus em ambientes distintos. Nas refeições, nas conversas em “off”, eram afáveis, curiosos e abertos para o diálogo. Contudo, no instante em que se reuniam para deliberar sobre seus interesses religiosos se transformavam em pessoas temíveis. Jesus nunca evitou encontrar-se com qualquer fariseu fora do templo. E não há registro de ele comparecer a qualquer assembleia oficial da seita.
O sumo sacerdote Caifás não devia ser tão ruim quando brincava com os netos, mas na hora em que assumia as funções de chefe do templo revela-se um facínora. Caifás foi capaz de conspirar na morte de um homem bom.
Conheço líderes religiosos cordatos e amigáveis, mas só se rodeados de filhos e netos. Desfrutei da intimidade de alguns e testemunho que foram companhias agradabilíssimas, desde que em ambientes não-religiosos. Os mesmos, vestidos em hábitos clericais, assustam. Reencontrei “companheiros” presidindo reuniões plenárias em suas instituições, e tremi. Um título tem força de desfigurar. Paletó e colarinho clerical ajudam na empáfia. Cargos têm força de suscitar pessoas implacáveis, legalistas e maquiavélicas. Um religioso não deve ser bom apenas no particular, ele tem de se mostrar coerente nos corredores de eclesiásticos.
A religião pode adoecer porque convive com três forças avassaladoras: poder, dinheiro e fama. O perigo aumenta exponencialmente quando se reivindica o nome de Deus. Facilmente um sacerdote pode se valer da Bíblia para escudar comportamentos nefastos. Quando influenciado por falsa onipotência, o religioso não hesita derrubar quem se coloca no meio do caminho. Consciente de que sua verdade é a revelação divina, elimina quem julgar nocivo. Imbuído de uma cruzada de conquistar o mundo, arrasa possíveis inimigos. Nessa trilha, o líder religioso vai se desfigurando, desfigurando, até encarnar o Iníquo.
Paulo advertiu a Timóteo que os “últimos dias” seriam difíceis (2Tm 3.1); previu sacerdotes vivendo uma “forma de piedade, mas negando-lhe o poder”. Que seriam inescrupulosos a ponto de entrarem “sorrateiramente nas casas para seduzir mulheres incautas”. Donos de um perfil pernicioso se pareceriam com bandidos comuns.

“Sabe, porém, isto: Nos últimos dias sobrevirão tempos difíceis; pois líderes religiosos serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes, desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem, traidores, atrevidos, enfatuados, antes amigos dos prazeres que amigos de Deus”.
O maior desafio de um líder não é só viver o que prega, mas tornar a sua religiosidade pública parecida como a que vive na vida particular. Para ser verdadeiro, basta que deixe a humanidade particular transbordar para os espaços religiososos. Se os santos engravatados continuarem tão humanos quanto as pessoas que vestem bermuda, está de bom tamanho.

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