por Hermes C. Fernandes, no Cristianismo Subversivo
Ao acessar hoje o meu perfil no facebook, deparo-me com o seguinte comentário: Você sempre está do lado do diabo. Junto com o comentário, um link de um post de Silas Malafaia sobre os pastores que se opuseram à eleição de Marco Feliciano ao posto de presidente da Comissão de Direitos Humanos.
Permita-me explicar as razões porque às vezes pareço estar do lado errado.
Olho para o mundo e vejo lampejos da graça de Deus em gestos, palavras, produções culturais, etc. Olho para a igreja e vejo anacronismo, sede de poder, narcisismo, e coisas que com tanta veemência parece condenar. Há coisas no mundo que gostaria de ver na igreja. E há coisas na igreja que a tornam muito semelhante ao mundo no que ele tem de pior.
Podemos afirmar que Jesus estava ao lado do diabo por ser tão duro com os religiosos do templo e complacente com os “inimigos”? Uma das principais razões pelos quais os religiosos conspiraram para mata-lo foi justamente esta. Como um rabino judeu poderia atender e elogiar publicamente um centurião romano? Como Ele poderia hospedar-se na casa de um cobrador de impostos, um traidor da pátria? Ao mesmo tempo em que comia com publicanos e prostitutas, Jesus era duro em Seu discurso contra os religiosos hipócritas.
Se Jesus estivesse do lado deles, jamais teria feito o que fez no templo em Jerusalém, expulsando os cambistas e acabando com a mamata dos sacerdotes. Se estivesse do lado deles, não os teria chamado de guias cegos, hipócritas, sepulcros caiados, filhos do diabo, etc.
Os que se dizem seguidores de Jesus parecem ter tomado o caminho inverso. Somos duros com os de fora e complacentes com os de dentro. Não importa se o sujeito prega um monte de heresia; se seus inimigos são os mesmos nossos, logo, deduzimos que é nosso amigo (ou seria, comparsa?).
Até quem não professe nossa fé, ao colocar-se contra os que consideramos nossos inimigos, torna-se nosso aliado. E assim, promiscuímo-nos. Aliamo-nos com aqueles que trazem um discurso raivoso recheado de preconceito. Seria como se Jesus abraçasse a causa herodiana.
Fiquei chocado recentemente quando li que a bancada evangélica encontrou na bancada ruralista uma de suas principais parceiras no congresso. Ambas se lixam para as questões ambientais. Estamos sempre dando as mãos aos reacionários, aos que defendem os direitos dos poderosos em detrimento dos desafortunados. Traímos nosso Senhor e Cristo.
O que fazer diante desta triste realidade? Particularmente, prefiro cortar na própria carne.
De acordo com Pedro, o juízo de Deus deve começar por Sua própria casa. Não é em vão que no livro de Apocalipse, antes de tratar com a grande Babilônia, Jesus trata com a Sua igreja, repreendendo, exortando, corrigindo, e eventualmente, elogiando. Como julgar Roma, sem antes corrigir a igreja que estava em Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodicéia?
Como poderíamos propor que o mundo se submetesse aos princípios e valores do Evangelho se em nossa própria casa isso não tem acontecido?
Veja, por exemplo, nossa ânsia por poder. Jesus disse que entre nós não deveria ser assim. Quem quisesse ser o maior deveria ser o serviçal. Que moral temos de conclamar o mundo a que tome Jesus como exemplo, servindo ao invés de dominar?
Jesus ensinou a humildade. Somos uma feira de vaidade.
Jesus ensinou a generosidade. Somos avarentos, gananciosos e mesquinhos. Basta ver os suntuosos templos fincados próximos a bolsões de miséria.
Jesus ensinou a amar até o inimigo. Incitamos uma cruzada contra qualquer que pense diferente de nós.
Jesus ensinou a discrição. Buscamos os holofotes a qualquer preço. Confundimos relevância com petulância.
Jesus ensinou a perdoar. Preferimos o caminho da revanche. Mexeu com um de nós, vai se ver conosco. Vamos jogar na cara da pessoa todo o seu passado, como fizemos recentemente com a Xuxa, só porque criticou um dos nossos.
Por isso o mundo não nos leva a sério. Somos uma vergonha para o evangelho de Cristo.
De que lado eu estou? Espero estar do lado da justiça, da verdade, e do próprio Cristo. Mesmo que isso me custe a reputação. Almejo estar ao lado da adúltera, não de quem quer apedrejá-la; ao lado das minorias esmagadas, não da maioria esmagadora; dos injustiçados, não dos injustos; dos oprimidos, não dos opressores; dos pecadores, não dos pretensos santos que disfarçam suas taras com o seu farisaísmo.
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