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sexta-feira, 1 de março de 2013

'Mudança de prioridade' do PT deve levar pastor ao comando dos direitos humanos da Câmara

Ocupada há 18 anos por parlamentares progressistas, presidência de colegiado pode ter como presidente o pastor Marco Feliciano, que vê homossexualidade como 'não natural'


'Mudança de prioridade' do PT deve levar pastor ao comando dos direitos humanos da Câmara
'Recebi 212 mil votos, tenho programa de TV e sou respeitado em 70 países. Tenho capacidade para dirigir a comissão' (Foto: Luiz Alves/Agência Câmara)
por Tadeu Breda, da Rede Brasil Atual

Uma "mudança de prioridades" da bancada do PT na Câmara dos Deputados possivelmente dará a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Casa ao PSC, que poderá entregá-la a um pastor evangélico. A definição virá apenas na próxima terça-feira (5), mas a notícia repercutiu negativamente hoje (1°) nas redes sociais e um abaixo-assinado online contra a indicação do religioso recebeu mais de 20 mil novas adesões em poucas horas.
Parlamentares ligados à questão dos direitos humanos presidem o colegiado desde 1995. Atualmente, também está a cargo das comissões de Educação e de Constituição e Justiça. Porém, de acordo com o deputado cearense José Guimarães, líder da bancada petista, o partido, que tem maioria na Casa, resolveu utilizar sua preferência para escolher outras comissões. Ficará com a Constituição e Justiça, Relações Exteriores e Defesa, e Seguridade Social e Família.
"Queríamos permanecer com Direitos Humanos, mas, quando fomos pedi-la, já não tínhamos mais direito de presidir nenhuma", explicou Guimarães à RBA. "O partido decidiu que as prioridades são outras, de acordo com a conjuntura." O parlamentar afirma que, pelo acordo estabelecido durante a semana com as bancadas partidárias, já está decidido que a Comissão de Direitos Humanos ficará com o PSC. "Mas ainda há espaço pra negociação", ressalva. "Vamos discutir nossos deputados mais ligados à área sobre o que fazer."
O atual presidente da comissão, Domingos Dutra, do PT maranhense, fica no cargo até a próxima quarta-feira (6) e não gostou da ideia de ser substituído por um pastor evangélico. "Valeria a pena trocarmos a presidência de alguma outra comissão para continuar com os Direitos Humanos", propõe, em conversa por telefone. "Essa comissão é importante para milhões de brasileiros que ainda não são cidadãos. Se iludem aqueles que acham que o Brasil está uma maravilha apenas porque é a quinta economia do mundo, tem hidrelétricas gigantes e novos aeroportos. Não está."
De acordo com Dutra, a Comissão de Direitos Humanos é a que melhor consegue manter a pouca credibilidade que a Câmara mantém na opinião pública brasileira. "Discutimos temas que interessam a toda a sociedade, como a propaganda televisiva para o público infantil", enumera. "Demos grande suporte à Comissão Nacional da Verdade, devolvemos simbolicamente mandatos de deputados cassados pela ditadura, ouvimos denúncias de indígenas, quilombolas, ciganos. Seria uma pena que a comissão fosse tomada pelos ortodoxos do parlamento."
Um dos ortodoxos a que se refere Domingos Dutra é o deputado Marco Feliciano, do PSC de São Paulo. Pastor evangélico da pequena cidade de Orlândia, no interior paulista, Feliciano é um dos parlamentares mais cotados para assumir a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara por indicação de seu partido. A prioridade, porém, está com seu colega do Pará, Zequinha Marinho, que não pôde ser localizado.
Marco Feliciano atendeu à reportagem por telefone e manifestou que teria o "maior prazer do mundo" em assumir o cargo. "A Comissão de Direitos Humanos acabou ficando com o PSC por uma eventualidade, mas não não acredito muito no acaso", afirma. "Seria muito interessante um partido de direita, como o PSC, com a mente aberta, reger essa comissão que está nas mãos da esquerda há mais de dez anos. E mostrar que não existe nenhum tipo de preconceito nem fundamentalismo religioso como estão falando por aí."
Com 40 anos, 140 mil seguidores no Twitter, saite pessoal com 20 milhões de visitas, programa de televisão, 15 igrejas e 212 mil votos, o parlamentar evangélico tem recebido duras críticas por posicionar-se contra os direitos – que chama privilégios – dos homossexuais à união civil e à adoção de crianças. Também causou alguma controvérsia ao postar nas redes sociais que os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé. É precisamente contra Marco Feliciano que o abaixo-assinado online com 21 mil assinaturas está dirigido. A seu favor, circula outro, com 139 até agora.
Como vê essa avalanche de acusações?
Fico assustado, porque não sou nem racista nem homofóbico. Sou de matriz negra, minha mãe hoje namora um cidadão que tem dois metros de altura e é negro. Tenho meu cabelo pichaim. Tudo isso nada mais é do que uma orquestração. É simplesmente porque sou religioso e tenho meu posicionamento. O único grupo que se levanta contra mim é o GLBT. Fiquei curioso para saber o que tem nessa comissão, porque é pequena, poucos partidos gostariam de ficar à frente dela, e agora aguçou minha curiosidade.
Não sei por que tanto interesse em bloquear uma pessoa religiosa. Um dos maiores lutadores pelos direitos humanos no mundo foi um pastor, Martin Luther King, homem que foi assassinado por seus posicionamentos, mas hoje é ovacionado. Era um cristão. Por que estão falando tudo isso de mim? Não sei, mas sei que não há como enfrentar os militantes LGBT intelectualmente porque não aceitam nenhum tipo de contrariedade a seus pensamentos. Não existe liberdade de expressão. Existe uma prisão intelectual quando o assunto são eles.
Sou um pastor, sou respeitado no país inteiro. Tenho legitimidade para estar no parlamento, capacidade para administrar a Comissão de Direitos Humanos e mostrar que existem coisas muito mais importantes que são abandonadas pela comissão. Por exemplo, existe hoje nos Estados Unidos um sem número de imigrantes brasileiros presos que são maltratados. Estive lá mês passado. Eles vieram me procurar. Nosso consulado lá mal tem um advogado pra atender essa demanda.
Outra coisa: como é que o Brasil pode manter relações comerciais com um país como o Irã? Um país que assassina gays e cristãos. Existem coisas que podem ser feitas na Comissão de Direitos Humanos e que não são feitas. De cada dez passos que são dados dentro da comissão, nove dizem respeito à comunidade LGBT. Quero que haja isonomia e equilíbrio. Tomara que meu partido consiga de fato essa cadeira. Não tenho a prioridade, mas, se o PSC assim decidir, assumirei com todo o prazer do mundo.
Por que seu nome está sendo ventilado como ocupante do cargo?
Porque eu sou uma pessoa que luta de fato pelos direitos humanos – pelos direitos, não pelos privilégios. Minha luta na Casa é contra o aborto. Encarei junto com os católicos, fomos pra cima do Supremo Tribunal Federal quando arguíram sobre o aborto de anencéfalos. Luto pela vida. Nas questões da criança, estou eu ali.
Imagina que a Comissão de Direitos Humanos no ano passado realizou um seminário sobre diversidade sexual na primeira infância. Como você pode falar de sexo com criança de zero a seis anos? Isso em outro tempo se chamava pedofilia. Ouvi representantes do governo federal dizendo que, se um menininho no jardim de infância sentir vontade de pegar no órgão sexual do outro menininho, a professora não pode impedir, porque criança não nasce homem nem mulher, nasce gênero e se descobre com o passar do tempo. Isso é um crime. E foi financiado pela comissão.
O senhor acredita que existe algum tipo de hegemonia da questão LGBT na Comissão de Direitos Humanos?
Existe uma ditadura branca lá dentro. Todos os projetos que os evangélicos apresentam, somos 83 deputados, quando chegam na comissão não dá nem tempo de discutir. São rejeitados de primeira. Ano passado apresentei projeto pedindo a realização de um plebiscito sobre a questão do casamento gay. Por que 513 deputados têm de votar algo que mexe com toda população de 200 milhões de pessoas? Por que não perguntar direto ao povo?
Tive muito apoio dentro da Casa, mas, quando chegou na Comissão de Direitos Humanos, falaram que eu estava sendo obscurantista e rejeitaram de cara, dizendo que era uma crueldade contra os gays. Mas não estamos num país democrático? Por que não perguntamos para as pessoas? Isso aconteceu nos Estados Unidos. Quer país mais democrático que os Estados Unidos? Eles perguntaram ao povo e em alguns estados o casamento foi aprovado.
Assim tiramos o assunto do parlamento e acaba essa briga. É um assunto tão podre! Toda vez que se fala de sexo entre pessoas do mesmo sexo ninguém quer colocar a mão, porque é podre. Por causa disso, um grupo de 2% da população – os gays – consegue se levantar e oprimir uma nação com 90% de cristãos, entre católicos e evangélicos, e até pessoas que não têm religião, mas que primam pelo bem-estar da família, pelo curso natural das coisas.
Não sou contra gays, mas contra o ato homossexual. Clodovil dizia: o que faço entre quatro paredes só cabe a mim e a meu parceiro. O problema não são os gays, mas o ativismo. É meia dúzia de pessoas que domina as redes sociais e usam o fascismo como arma. Tem hora que dá medo. Já fui ameaçado de morte pelo Twitter, porque não tem conversa com os ativistas. É ruim pra democracia. Eles podem estar criando hoje uma perseguição religiosa num país livre. É muito perigoso.
O senhor acredita que extista perseguição contra homossexuais no país?
Não consigo enxergar isso. Existe violência, claro, em todas as áreas. Dizem que tem crescido a violência contra os homossexuais. Aí você procura saber quem é que pratica a violência contra eles – e são as pessoas que os procuram pra fazer sexo. É horrrível, é triste, é desumano, ninguém deveria morrer por sua opção sexual ou religiosa nem por nada. Mas falar que o Brasil é um país homofóbico não é verdade. É uma bandeira. É uma criação para que no futuro não haja mais moralidade.
O que o senhor chama de moralidade, deputado?
Moralidade é o respeito à família, é o respeito que eu aprendi com meus pais. É você entrar com seu filho dentro do shopping center ou em qualquer lugar e não ver dois homens de barba se agarrando na sua frente. Um casal hétero já fazendo isso de maneira leviana, aqueles amassos, já constrange. Imagine sua criança ver isso com duas pessoas do mesmo sexo? É horrível. Já foi pra parada gay? Veja as fotos: as pessoas mostrando seus órgãos genitais, pegando os símbolos sagrados da Igreja Católica e fazendo atos obscenos. Se não respeitam, como querem respeito? Nem todos são assim. Existe o ativismo que beneficia uns poucos. Sei que tem as mãos das Nações Unidas nisso. Existe uma comoção internacional para que os direitos dos gays estejam acima dos direitos dos demais cidadãos.
O senhor é a favor da união civil entre homossexuais?
Eu acho desnecessário. Já existem liminares que concedem a eles as partilhas de seus bens. Querer a união civil é uma afronta. Eles querem viver como casais, mas não são casais. Não podem gerar filhos. Aí tem a adoção: outro problema. Uma criança criada por dois homens ou duas mulheres não terá um futuro normal. Isso gera bloqueios psicológicos. Não foi assim que o mundo foi criado. Estamos falando de crianças, de pessoinhas que não sabem o que é certo e o que é errado – e precisam ser ensinadas. Quando vejo os gays pedirem a união estável, daqui a pouco já terão a união civil e daí pra união religiosa é um passo. Aí vai começar a tocar em assuntos que não compete a eles.
O senhor acredita que uma pessoa cristã, por princípio, seja católica ou protestante, não pode ser homossexual?
O cristianismo diz que o homossexualismo não é natural. É bíblico e, como pastor, eu não posso fugir da Bíblia. Se a questão é fazer sexo, existe no cristianismo o que chamamos de sacrifício: a pessoa se tranca dentro dela e faz uma renúncia pela sua fé e, independente do seu sexo, ela pode estar dentro da igreja adorando a deus. O que a igreja não comunga é a união de pessoas do mesmo sexo. Primeiro porque os órgãos sexuais do homem e da mulher não foram feitos para esse uso anti-natural. O reto não foi feito para ser penetrado. A sodomia é algo que constrange. Causa repulsa.
Mas nós amamos essas pessoas. Em nossa igreja temos meninos que vieram da homossexualidade. E, em alguns casos, as pessoas revertem sua opção sexual, existe a conversão. Eu conheço pastores que são casados e vieram do transformismo ou do lesbianismo. Hoje existe a defesa dos gays, mas não existe a defesa dos que não querem ser gays.
O Conselho Federal de Psicologia pune qualquer profissional que tente tratar um homossexual, mesmo que ele peça ajuda. O psicólogo deve ter o direito de atuar. Uma mulher está com um problema afetivo exacerbado e passou por depressão pode receber atendimento se for hetero, mas para homossexual não pode. É preciso o Brasil acordar, existe alguma coisa acontecendo. Se não se botar um freio, com respeito, não sei onde vamos parar. Talvez seja esse o medo da comunidade para me enfrentarem de maneira tão dura, com medo de eu entrar na comissão e descobrir coisas que eles não querem.
Como o senhor vê os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, das pessoas que foram mortas e perseguidas pela ditadura?
Quando se mexe demais em um assunto podre, acaba exalando mau cheiro. Já existem pessoas competentes cuidando disso, estão chegando a um consenso. Acho que as pessoas acusadas já são mais punidas do que tudo, mas a justiça tem que ser feita, mesmo que fora de hora. Nós teremos alguém olhando para isso dentro da Comissão de Direitos Humanos se eu for presidente.
O senhor é a favor de um eventual julgamento e punição às pessoas que forem comprovadamente apontadas como torturadores?
Um criminoso tem que ser punido. O tempo não apaga a dor das famílias, das pessoas que foram torturadas, dos que são herdeiros dos torturados. Se os torturadores estão vivos, precisam pagar diante da sociedade. Precisam expurgar seu pecado.
O senhor é a favor da demarcação das terras reivindicadas pelas populações indígenas ou é da opinião de que os indígenas já têm terras demais no Brasil?
Olha, é preciso fazer um levantamento. Só cionheço o assunto superficialmente. Fiquei sabendo o que ocorreu no Mato Grosso há alguns meses: 170 mil hectares. É terra pra chuchu. O Incra confiscou as terras por causa de 500 índios. Ao entrevistar alguns índios, eles disseram: "não queremos a terra, até abrimos mão pra ter uma vida na cidade". Mas não foram ouvidos. As pessoas querem que simplesmente seja feita alguma coisa pra tomar as terras. Foram 30 mil famílias prejudicadas em nome de 500 índios numa extensão de terras de 170 mil hectares. Aí tem coisa.
E em relação ao trabalho análogo à escravidão?
Sou totalmente contra. Têm que ser punida as pessoas que fazem isso. Todo ser humano tem o direito de ir e vir, a Constituição deve ser respeitada. Todo tipo de criminoso que tem usado vidas humanas pra se beneficiar tem que ser punido. Votei favoravelmente à PEC do trabalho escravo.
O senhor acredita que existe perseguição a alguma religião do Brasil?
Claro que existe. Eu, por ser evangélico, estou sendo perseguido pra não assumir a Comissão de Direitos Humanos. Existe pastor que não presta? Existe, em todo lugar tem gente que não presta. Mas medir todos por um só é estranho. As pessoas precisam respeitar porque o movimento evangélico só cresce no país. O que fez a igreja cristã crescer no mundo foi a perseguição. Quanto mais bate, mais volume dá.
Mas, na visão do senhor, existe perseguição apenas ao cristianismo ou também a outras religiões?
Tudo é proporcional, mas todos sofrem perseguição. As religiões de matriz africana também, os muçulmanos. Como nosso país é livre, todos devem ter sua liberdade. Mas não se pode tolher o direito das pessoas pensarem o contrário. Só não posso bater, infringir dor, torturar. Isso não posso. Pensar contrário, porém, é um direito meu. Isso é democracia.
E aquilo que o senhor disse da África, que os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé?
Antes de ser deputado, eu usava o Twitter para dar aula de teologia. Alguém me perguntou por quê o continente africano sofria tanto. De fato, o continente africano sofre demais com a fome, pobreza, guerras étnicas, Aids. São fatos. Como sou um homem espiritual, conheço a Bíblia e acredito nas histórias da Bíblia, sei que Noé saiu da Arca e teve três filhos. Um deles cometeu um grave erro. Noé lançou sobre ele uma maldição patriarcal.
A Bíblia diz que maldição existe, mas pode ser quebrada em Cristo. No meu pensamento, vejo que existem alguns lugares que não vão pra frente. Existem. Eu nunca disse que um negro era maldito. Eu disse que há sobre o continente africano o peso de uma maldição patriarcal lançada pela boca de Noé, mas que poderia ser quebrada. Lembrando que o continente africano tem brancos também, como na África do Sul. Mas as pessoas pegaram essas declarações de maneira maldosa e leviana e me picharam como racista.
O senhor é a favor das cotas para negros nas universidades?
A lei já foi sancionada e as cotas estão sendo aplicadas. Isso é legítimo por tudo o que os negros sofreram em nosso país. Foram escravizados, inclusive intelectualmente. Se pudéssemos voltar no tempo e tirá-los da escravidão, dando a mesma oportunidade que os demais tiveram, hoje certamente não haveria esse problema. Mas é um direito deles.

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